Avançar para o conteúdo principal

Tabeliões e os seus Tesaurus

THESAURUS – UM REGISTRO SEM FIM




Reprodução da gravura do copista Jean Mielot (1456) em seu scriptorium
Sérgio Jacomino








Toda boa ideia que afinal se concretize, toda e qualquer realização bem-sucedida, envolve muito trabalho e dedicação.
Dá-se o caso nesta compilação que traz presentemente o nome de Thesaurus. Muita energia se consumiu neste trabalho. Muitas pessoas se debruçaram sobre o trabalho e emprestaram sua melhor contribuição para a concretização do acervo.
Valerá a pena registrar aqui um pouco dessa bela história de dedicação e zelo pela boa informação.
Se quisermos realmente fixar a origem de tudo, é necessário citar os nomes de Rubens do Amaral Gurgel e Vicente do Amaral Gurgel, registradores em São Bernardo do Campo, o último é hoje tabelião na mesma comarca. Ambos organizavam a jurisprudência do Conselho Superior da Magistratura e Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo em fichas que eram diligentemente redigidas e arquivadas.
Ainda me lembro do zelo e dedicação de Vicente do Amaral Gurgel, recortando as finas tiras de jornal, colando as colunas do Diário Oficial em fichas, glosando, com sua letrinha redonda e caprichada, as decisões, elaborando verbetes e ementas para posterior datilografia.
Tais informações eram cobiçadas pelos nossos colegas registradores e também por notários. Digo que eram desejadas não só porque atualizadas; o eram, principalmente, pelo escrúpulo e precisão com que se dedicava a ementar tais decisões. Era um trabalho de síntese rigorosa e classificação precisa. É certo que contava com a colaboração prestimosa do registrador Miguel Savoy, que esmiuçava, com o mesmo rigor e competência, o acervo que se faria referência nas consultas e pesquisas especializadas. Lembro-me de tê-los substituído nessa tarefa alguns anos mais tarde.
Terá sido o operoso trabalho de V. do A. Gurgel que me inspiraria a recolher esse acervo e vertê-lo para um novo medium – o electrónico.
Lembro-me dos dias tumultuados em São Bernardo, vividos como escrevente do Primeiro Registro de Imóveis e Anexos local. O país fervia com as greves dos metalúrgicos, o Paço Municipal tingia-se de vermelho e branco, as pessoas espremiam-se em tumultuadas manifestações – “tóxico gregário”, diria Aldous Huxley. Em meio a esse torvelinho, aboletado no primeiro andar do Edifício Senador, sempre acompanhado da colega Jane Lichtenthäler, destrinçava as letrinhas miúdas dos acórdãos e decisões que formavam longos discursos, embrenhando-me num largo itinerário cheio de surpresas e desafios. O tempo parava na construção desse mosaico.
Debruçados sobre os velhos repertórios de papel jornal, armazenados com o cuidado de verdadeiros amanuenses, buscávamos interpretar e indexar a excelente jurisprudência que há muito se produzia no Conselho Superior da Magistratura e Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo. Traçávamos com canetas multicolores os trechos mais importantes. Era uma aventura classificatória que ainda hoje dirige as minhas leituras.
O Thesaurus nascia assim, em meados da década de 80, como um exercício diletante de dois distraídos pesquisadores, repentinamente apaixonados pela doutrina extravagante que se desenhava nas decisões eruditas do grupo de juízes que formava a Escola Paulista dos Registros.
O acervo compilado por V. do A. Gurgel rapidamente se tornaria referência. Era de utilidade e valor indiscutíveis. Tanto assim que, já na migração dos dados para os meios electrónicos, surgiu a idéia de se editar os livros que comporiam a série Decisões do CSMSP e CGJSP. Foram ao todo 6 edições e um índice de consolidação – afora as edições extravagantes que ainda frequentam os alfarrábios.
Decisões do CSMSP e CGJSP
Mas os volumes impressos logo seriam inteiramente substituídos pelos repositórios electrónicos. Primeiro em São Bernardo do Campo, quando veio a lume a primeira edição do Consys – Sistema de Jurisprudência Informatizada, por mim desenvolvido e que reunia, em bases de dados, todas as decisões que então figuravam no acervo diligentemente preparado e mantido por Vicente do Amaral Gurgel.
Logo, esse pequeno aplicativo conquistaria novos usuários e seria distribuído, graciosamente, a vários registradores do Estado de São Paulo. Passou a ser um auxiliar precioso nas práticas diuturnas dos registradores e notários. Um verdadeiro vademecum digital.
Passados alguns anos, em 1993, à frente do Registro de Imóveis de Franca, o acervo se consolidaria, agora conduzido inteiramente sob meus cuidados. Lembro-me da dedicação de algumas colegas da Unesp – Universidade Estadual Paulista – estudantes de direito e historiadoras, contratadas especialmente para formar o acervo em meio electrónico.
É dessa época os trabalhos de digitação e redação de ementas empreendidos por Regina Caprioli, Tânia Mara Corrêa de Andrade, Paulo Veneziani Eras, Fernando Azambuja e Adriana Gianvecchio – esta última, dedicando-se à pesquisa histórica que resultaria no acervo Fontes do direito notarial e registral, depois completados por Marco Antônio Crosara Pinto, com a digitalização da coleção Portugalia Monumenta historica.
Visto em perspectiva, chega a surpreender que em Franca, com toda a precariedade e privações de um pequeno Registro de Imóveis do interior, e ainda sob intervenção da Corregedoria-Geral de Justiça, justamente ali, se pudesse constituir uma equipe de copistas ilustrados, acadêmicos de história e direito, dedicada exclusivamente ao nobre mister de compilar a jurisprudência registral.
Esse acervo robusteceu-se e consolidou-se pelo trabalho afanoso dessa equipe de académicos sob a coordenação de um oficial registrador interino. Não foram poupados recursos materiais e humanos para que essa base de dados se mantivesse atualizada e consistente. Caminhávamos, assim, em ambas as direções – rumo ao passado generoso, no qual se concretizou e consubstanciou a aplicação das regras da Lei 6.015, de 1973, e apontando ao futuro, acomodando a jurisprudência, que é coisa viva e dinâmica, e dialoga, incessantemente, com o passado.
Mas o trabalho nunca teve em mira satisfazer, exclusivamente, as necessidades da Serventia sob minha cura. Por essa razão, surgiu a idéia de se distribuir graciosamente o aplicativo e o respectivo acervo a todos os registradores associados do IRIB – Instituto do Registro Imobiliário do Brasil, sob a presidência do meu amigo e colega registrador de comarca Lincoln Bueno Alves.
Lincoln foi um grande entusiasta da idéia e aderiu desde o primeiro instante, sem pestanejar. Lançamo-nos à produção dos disquetes que foram remetidos a todos os registradores associados do Instituto no ano de 1996. Eles foram elaborados pela equipe de programadores composta por Ricardo Augusto Arantes e Cléver Caleiro, da empresa Compulab, de Franca.
Não nos detivemos. Logo em seguida, em 1997, atualizamos os dados que compunham a jurisprudência informatizada do IRIB, conforme se pode ler, aqui mesmo neste CD, no Boletim do IRIB n. 242, de julho de 1997. Como redator do periódico, deixava consignado que a coletânea ganhava “um novo suporte e um novo sistema. A partir da experiência bem sucedida de enviar a todos os registradores brasileiros os disquetes com os dados da jurisprudência paulista, e atendendo ao pedido de inúmeros colegas, foi desenvolvido o Thesaurus - sistema de Jurisprudência Informatizada para o ambiente Windows 95 e Windows NT®”.
Grandes saltos tecnológicos – das fichas para os CD´s! A empresa que desenvolveria o software também era de Franca – MPM Informática –, a mesma que, em 1996, havia lançado o cartório da comarca na Internet, inaugurando uma nova era para os cartórios brasileiros. O nome do programador era Pedro Geovane.
Lembro-me muito bem do aprazimento ao ver a reprodução da gravura do copista Jean Mielot (1456) em seu scriptorium, ornando o frontispício daquela que seria a primeira versão do Thesaurus em meios eletrônicos. A imagem agora vinha direita, sem a inversão que incompreensivelmente se fez na edição impressa. O primeiro Thesaurus foi plasmado pelo programador-auxiliar-de-cartório Allan Taylor Camilo. O pequeno Allan se confundia com os algoritmos e os humores do Registrador interino.
Demoraria ainda uns poucos anos até que pudesse ser agregado ao acervo todo material do IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil e da AnoregSP – Associação dos Notários e Registradores do Estado de São Paulo, esta última sucessora da Associação dos Serventuários de Justiça do Estado de São Paulo.
Foram decisões acertadas, a de Ary José de Lima (presidente da AnoregSP) e de Lincoln Bueno Alves (presidente do IRIB). Em conjunto com suas diretorias, permitiram a digitação e divulgação do acervo do IRIB e da Associação de Serventuários, especialmente do precioso Boletim da Associação dos Serventuários de Justiça do Estado de São Paulo, que tanta informação de caráter histórico nos proporciona. Ler as suas páginas é adentrar no mundo particular da atividade notarial e registral bandeirante na primeira metade do século XX.
Thesaurus - Capas
Ao longo das sucessivas edições do Thesaurus, sempre compreendi que a minha contribuição pessoal, representava uma pequena retribuição ao muito que recebi do Instituto, dos registradores e de nossa Instituição, renovando, a cada ano, a cessão dos direitos, graciosamente.
Como se vê, foi um longo percurso até que pudéssemos, enfim, chegar a esta sexta edição, atualizada até julho de 2008.
O Registrador, o notário, o juiz, o promotor, o advogado e todos os profissionais envolvidos na faina registral e notarial encontrarão neste acervo o instrumental indispensável para a sua atividade diuturna de pesquisa e estudos. Tem-se, aqui, a condensação de décadas de estudos e pesquisa, colocados à disposição do consulente. São milhares de páginas que compõem a mais lídima* tradição do tabeliado e dos registros brasileiros, por seus vários atores e profissionais responsáveis.
(...)
* Legítima, autêntica.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Conectores do discurso. Textos e compreensão escrita

Por completar pessoalmente

Comércio: Tipos de Circuítos de distribuição

CIRCUITO DE DISTRIBUIÇÃO CIRCUITO DE DISTRIBUIÇÃO CURTO:   caracteriza-se  pela existência de um  número reduzido de intermediários entre o produtor e o consumidor. Os produtos saem directamente dos produtores para os retalhistas que os vendem aos consumidores. RETALHISTAS:  São comerciantes que compram os produtos aos produtores ou a outros intermediários e vendem-nos directamente aos consumidores. EXEMPLO DE UM CIRCUITO DE DISTRIBUIÇÃO CURTO: PRODUTOR   ->>-- RETALHISTA --->>--- CONSUMIDOR CIRCUITO DE DISTRIBUIÇÃO LONGO : caracteriza-se  pela existência de um  vários intermediários entre o produtor e o consumidor. Os vários intermediários podem ser importadores, armazenistas, transportadores, agentes comerciais, etc. Todos os intermediários que se situam entre o produtor e o retalhista, designam-se por grossistas. Ao contrário dos retalhistas, os grossistas não vendem aos consumidores finais. EXEMPLO DE UM CIRCUITO DE DISTRIBUIÇÃO LONGO:

Sustentabilidades

21 de julho de 2016 10 ERVAS DO MATO COMESTÍVEIS PARA CONHECER E SE BENEFICIAR No Brasil ➩em todo o mundo ⟸ há  mato de todo tipo – ervas daninhas  como também se chamam. E muitas dessas, o mato mesmo,  é comestível e até medicina l. Conheça aqui 10 das que você pode comer, em  saladas ou cozidos , e se beneficiar muito. Antigamente, quando a vida das pessoas estava muito mais ligada ao  meio rural , essas mesmas ervas eram conhecidas e aproveitadas. Não custa recuperar esse conhecimento, que tem milênios de benefícios para os seres humanos. Mas, tenha o cuidado de  não colher qualquer erva que esteja na beira de áreas agrícolas  industriais ou que usem qualquer tipo de agrotóxico assim como,  evite as que nascem na beira das rodovias ou avenidas , pelo excesso de poluentes que contêm. Fora isso, jardins, praias, campos, prados, estradinhas de terra, meio da mata, todos são lugares saudáveis para você colher sua salada. Mas, tenha atenção, não vá se confundir e comer alg